terça-feira, 24 de novembro de 2009

Diga-me o perfil, que eu te direi quem é

Camila Barreto

Curioso mesmo é esse submundo virtual chamado site de relacionamentos. Cada dia é um link diferente. Os insights dos usuários em peripécias registradas em fotos é o que me deixa mais perplexa. Como as pessoas gostam de uma lente! E se tem gente que adora o verbo aparecer, tem muito mais que adora a ação fuçar.

A inserção prática de informações pessoais numa página acessada pelo mundo inteiro fez com que pensássemos que aquela fofoca de porta entre vizinhos e comadres estivesse acabada. Pura ilusão! É só porque em tempos de globalização e corre-corre ninguém tem mais tempo de ficar uma ou duas horas de pé falando de ‘fulano que se separou de fulana’, ou de ‘beltrano que foi a uma festa e saiu catando fichas’.

O velho sistema olho no olho e ouvidos bem abertos, foi aprimorado para olho na tela e dedos afiados nas teclas. Porém, não se preocupe você, indivíduo que cresceu sabendo dos acontecimentos porque ouvia indevidamente conversa de gente grande, pois, é fácil se adaptar. Quem estava de pé agora se senta. Basta, estando na internet fazer um ‘login’, fazer um ‘add’, tornar-se ‘amigo’ e pronto! Você é mais um a tomar conta da vida dos outros, salvo uma regra clara: os outros também tomarão conta da sua. A essência é a mesma de antes, só mudou o meio de transmissão, e por horas e horas você se manterá ali.

Intrigante é ver como esse tipo de site gira em torno da pessoa e ela em torno do mesmo, numa espécie de translação alternada, por vezes simultânea. O perfil exibido descreve além das características físicas ou profissionais, pois há uma nova modalidade, surgindo a ‘necessidade’ agora em anunciar para ‘apenas os amigos’ da rede ou para ‘apenas os amigos dos amigos’, (assim: se você possuir uns trezentos amigos e cada um deles mais trezentos, no final dá uma quantidade desprezível, bobagem) se está triste, doente, ou para que saibam que estou de luto. Para isso o perfil deve estar em letras garrafais e laço preto o nome “LUTO”, para que possam ter noção do tamanho do meu sentimento; a imensa dor e comoção, não impediram de dar um pulinho na internet e deixar registrado antes de ir ao enterro. Futilidade... Hipocrisia... Já inventaram o luto virtual.

Acredito que tais sites colaboram na composição de muitas caras do modismo ‘eu sou único e original’, e do ‘me chama para ser capa de revista’, não fazendo generalizações, e faz aflorar em alguns o desejo de ‘minha vida como queria que fosse’, em um reality show diferenciado, onde todos te veem nas melhores poses, ângulos, roupas, lugares, no seu melhor sorriso. Não expomos os acontecimentos reais da maneira que exatamente sucedem, portanto, aquelas páginas reproduzem imagens virtuais, de momentos virtuais, de sentimentos e feições também virtuais. As lentes têm aversão ao individualismo, às caras feias e às atitudes desagradáveis, estes, muito mais comuns do ser humano. E se pudéssemos ver e sentir tudo isso pela tela, iria feder, e muito.

Não é mais interessante que as fotos das reuniões em família, dos aniversários e dos almoços de domingo estejam apenas no “Álbum da Família”, e que sejam mostradas apenas aos mais chegados. É preferível que chegados, distantes e desconhecidos vejam nos álbuns virtuais e mais uma vez “tomem parte” de acontecimentos que deveriam ser mais preservados, mais íntimos. “Chama todo mundo para tela do computador para ver e falar mal das fotos de ‘fulano que casou e nem nos convidou’.

As ‘atualizações’ caminham rápido na internet, e com elas a dispersão e banalização das relações. Podemos tranquilamente preencher um cardápio dos melhores e piores momentos meus, seus, de fulano e de sicrano. Servi-los: experimentem, analisem, deem sua nota como os críticos fazem. Pior que fazem. Pior que fazemos. Não me isento desse mundo virtual, e também adoro ‘atualizações’. Os julgamentos feitos dispensam o cumprimento da profecia apregoada no Apocalipse do dia do Juízo Final. Pra quê? Já fomos julgados e julgamos antes de Ele voltar. Nisso tudo não tenha dúvida, o julgamento é real, nunca virtual.

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