sexta-feira, 13 de novembro de 2009

As botas do Tio

Thamires Assad

Estava eu no píer da faculdade, quando o Tio do apoio chegou para regar as plantas, e então click, suas botas me chamaram a atenção. Qual o percurso que aquelas botas já passaram? Com certeza por cima da lama, da areia e dos cocozinhos dos pombos, patos e outros animais que habitam aquele lugar, sem esquecer do pavão majestoso e suas companheiras que flertavam enquanto eu tirava fotos.

Mas me refiro a outros caminhos, os caminhos da vida daquele tiozinho que mal sei o nome... Será que, como a sua bota, a sua vida também era amarrotada e melecada? Será que ele era frouxo como os seus cadarços desamarrados? Ou tudo isso nada significa e são apenas botas meladas? Esse tal João, Francisco, Pedro, Tio ou qualquer que seja o seu nome teria noção de que suas botas meio desengonçadas iriam chamar a atenção de alguém?

Nós andamos muito pela vida e como ou com o que andamos muitas vezes reflete o que somos ou sentimos. Quem gosta de andar descalço pode querer liberdade ou não tem um sapato pra calçar, quem anda de salto pode ser fashion ou ser manco e estar corrigindo um defeito. Andamos pelas calçadas, ruas e avenidas, de pantufas sandálias e botas. Ah... As botas do tio, como elas podem até refletir a esfera política do nosso país, deveriam servir pra confortar e proteger, mas, se repararmos, está cheia de carrapichos.

De volta ao cerne da minha observação, eis o simpático senhor com a pura cara de interior: Aquele típico dono de uma terrinha com seus animais e uma família guerreira nordestina! Guerreira como milhões no Brasil afora, retratos dos “vidas secas” espalhados pelo país e pelo mundo. Mas ele não me parece infeliz, ele está ali com sua calmaria, regando as plantinhas, parece que aquilo o satisfaz, ele demonstra um apreço por tudo aquilo que ele cuida, pode ser alí o seu elo com sua vida pacata do interior. Sim! Eu ouso dizer que ele tem um vínculo com a vida rural, pois, ao erguer minha cabeça, me deparei com ele usando um chapeuzinho preto, dando um toque especial ao conjunto que se fincou à minha mente. Um antigo retirante, retrato do êxodo rural, regando, com carinho, as plantas do píer da faculdade, como se fossem parte da sua terra, do seu passado e futuro. Tudo isso sustentado por suas botas, as não tão simples botas.

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